ANO BRASIL PORTUGAL 2012/2013
Paulo Timm / Covilhã-Portugal 28ago2012
“Minha pátria é a
língua portuguesa”
Fernando Pessoa
“Da minha língua vê-se o mar”
Vergílio
Ferreira
VIDEO – PORTUGAL – BELEZA DA SIMPLICIDADE - http://www.youtube.com/watch?v=m34Wv-2yjQo&feature=player_embedded
Enfim, no ar, a Programação do Ano Brasil-Portugal
2012/13: Um conjunto de atividades em vários domínios das artes, segmentos da
economia e encontros culturais em ambos os países, com vistas a se tornarem
cada vez mais conhecidos.
“O Ano Brasil-Portugal é a sequência de uma série de celebrações do
Brasil com países diretamente ligados à sua história, seja como colonizador, no
caso do irmão lusitano, ou como imigrantes que aqui se instalaram e criaram
raízes definitivas, caso do ano Brasil-Itália e ano do Brasil na França.”
“Este espectro de eventos
deverá
desenvolver-se ao longo de
todas as regiões do Brasil, com presença directa em múltiplas
Cidades e cobertura mediática
de alcance nacional.
Em segundo lugar, a
arquitectura do nosso programa é aberta à contribuição da Sociedade Civil.
Este programa apenas poderá
ter o sucesso desejado se forem desenvolvidos mecanismos
eficazes de integração da
Sociedade Civil na sua construção. Esta abertura à contribuição de
terceiros é igualmente um
pilar fundamental da nossa estratégia, seja pela possível inclusão de
eventos já planeados por
outras entidades, seja pela possibilidade de angariação permanente de
ideias, propostas e
candidaturas a novos eventos através do nosso website-
(Apresentação de Miguel Horta e Costa,
Comissário-Geral do Ano de Portugal no Brasil - www.anodeportugalnobrasil.pt. )
)
Da
parte do Brasil, a FUNARTE informa que há duas formas de participar do Ano
Brasil Portugal, ambas formalizadas em dois
Editais disponíveis aqui , aos interessados. Informações adicionais ou dúvidas devem ser encaminhadas por meio do
Fale com o
Ministério ou dirigidas a
Ouvidoria.
Uma
delas é através do concurso de 72 atrações
musicais para compor a programação do Espaço Brasil, de janeiro a junho de
2013, em Portugal. Cada uma das atrações escolhidas receberá R$ 10 mil .
“O concurso é uma realização do Ano Brasil-Portugal e o seu
objetivo é garantir a representação da música brasileira, que se caracteriza
pela diversidade e inventividade.
O
material de inscrição deverá ser postado pelos Correios (via Sedex), em
envelope único, para: Edital de Música Ano do Brasil em Portugal - Rua João
Afonso, 65 / casa 3 Humaitá – Rio de janeiro – RJ – CEP 22261-044.”
A outra , será através
de “iniciativas independentes” , nas quais . poderão participar produtores culturais,
associações, cooperativas, empresas com ou sem fins lucrativos, órgãos públicos
e fundações privadas da área cultural, que receberão uma chancela oficial do
Evento.
.A
cerimônia de abertura conjunta do Ano de Portugal no Brasil e o Ano do Brasil
em Portugal, será no dia 7 de setembro e
se estenderá até 10 de junho de 2013, Data Nacional de Portugal. Espera-se a
presença da famosa fadista portuguesa
Mariza - Mariza and the Story of Fado | Facebook,
num espetáculo conjunto com Roberta de Sá, acompanhadas pela Orquestra
Sinfônica de Brasília. A mesma Mariza, com Milton Nascimento se apresentará,
novamente, no Teatro Municipal do Rio de
Janeiro, no dia 12 de setembro, evidenciando a importância que o Governo de
Portugal dará ao Fado como um de seus mais valiosos Patrimônios Culturais.
A
inauguração oficial do Ano de Portugal,
porém , só ocorrerá no dia 9 de
setembro, em Belo Horizonte, com a
assinatura de um Protocolo entre os dois
Governos.
Até
aqui, enfim, as informações sobre o Ano Brasil Portugal. Agora, a crítica...Até
porque, além de brasileiro, Pereira por herança do avô materno, resido em
Portugal. Sinto na pele as pulsações entre nossos países. E não consigo,
andando pelos meandros do Chiado, em Lisboa, viajando pelo interior, morando
numa cidade pequena, quase desconhecida dos brasileiros, ao nordeste, deixar de
viver, diuturnamente, nossas semelhanças e diferenças. Tudo tão igual... Tudo
tão diferente...Portugal, renascentista; o Brasil, hiper-moderno. Entre ambos
um fio de esperança...
De
comum, uma certa apatia frente à coisa pública, nos dois países submetida à
crítica ácida, mais bem humorada no Brasil,
enquanto aqui, cruelmente retratada pela literatura, desde os clássicos
de Eça de Queiros.
Como
diferença, o estado de espírito, sensual no
Brasil, aqui intensamente épico, ambos, porém, portadores de uma tristeza
enigmática. A portuguesa, recolhida do grande Mar Oceano; no Brasil, cultivada
sertão adentro , como revelam, de um lado, uma
das trovas mais belas da língua portuguesa, de autoria de um poeta pouco
conhecido, Antonio Correia de Oliveira (I), de outro , o poema de Drummond (II):
I
Oh águas do mar salgadas
De onde lhes vem tanto sal
Vem das lágrimas choradas
Nas praias de Portugal
II
Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar...Um homem vai
devagar
um cachorro vai devagar
um burro vai devagar
devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus!
No
plano histórico , uma questão incontornável. Como outros países europeus,
Portugal foi uma Potência Colonial e os monumentos aos heróis que “tombaram em
defesa da pátria” , abundam. Nós, ex- colônias , temos outra visão deste
processo, até hoje mal digerido em toda a Europa.Como encaminhar um
entendimento comum sobre a Questão Colonial?
Apesar,
pois, do Ano Brasil Portugal incorporar-se, como afirma Antonio Grassi,
Presidente da FUNARTE e responsável , pelo lado brasileiro, da montagem da
programação, à “sequência de uma série de celebrações do Brasil com
países diretamente ligados à sua história”, o caso
de Portugal estaria a exigir uma melhor conceituação do evento. Mas inteligência
não é uma matéria prima muito cultuada no Ministério que lhe sugere o nome...
Portugal
ocupa um lugar ímpar na nossa formação. Temos 300 anos de uma História comum,
que se prolongou, na figura de nosso D.Pedro I como Rei de Portugal depois de
sua vitória “liberal” sobre as forças conservadoras de Dom Miguel. E compartilhamos
a mesma literatura, mercê da língua
comum. Ora, o que há de mais importante na história da civilização do que a
língua? Sobre ela, aliás, estamos a tratar
de consolidar o Novo Acordo Ortográfico, ainda com áreas de resistência nos
dois lados do Atlântico. Deveríamos , pois , ter dado uma maior ênfase, durante
o Ano Brasil-Portugal, à literatura. Mas isto não está ocorrendo. O ponto de
partida e de provável encerramento está marcado pelos espetáculos musicais,
importantes, mas que mais nos separam do que nos aproximam. Portugal lamenta o passado
heróico; o Brasil festeja o futuro incerto... A língua nem aproxima, nos une.
Somos uma mesma fraternidade luso-fônica, avaliada, hoje, como de considerável
peso numérico e grande distribuição pelos vários continentes, como das mais
importantes do mundo. De resto, continuamos, com a ênfase na música, coniventes
com a sociedade do espetáculo, quando esta já dispõe , pela indústria cultural
mecanismos próprios de afirmação e divulgação. E, neste sendeiro, não faltará,
por certo, um “amistoso” entre as duas grandes seleções de futebol...
A
partir da ênfase na literatura poderíamos aproveitar o Ano Brasil Portugal para
aprofundar nossas relações recíprocas. Podíamos conhecer melhor a obra de uma Deolinda Gersão , autora do romance A
Árvore das Palavras [resenha | comprar], vencedor do
Prêmio de Ficção do PEN Clube português. E eles poderiam conhecer melhor nosso
grande poeta mineiro Anderson Braga
Horta, autor de Fragmentos da Paixão,
uma verdadeira obra prima poética. Tendo vivido muitos anos no
Chile, como algum tempo nos Estados Unidos, vejo como estes países cultivam
relações especiais com suas respectivas “Mães Pátrias”: Espanha e Inglaterra . Como
há um sentimento profundo de orgulho na
comunhão do mesmo idioma! Brasil
e Portugal, ao contrário, parecem afastar-se cada vez mais. Apesar disto, não
há animosidade entre as duas comunidades. Cá, somos tratados, em todas as
partes com carinho, sendo freqüente, à percepção de nossa origem brasileira, o
alinhavo de uma história de família : “Meu irmão mora há 30 anos no Rio”; “meu
filho foi há dois anos para São Paulo”; “Ah, o Brasil, ainda quero conhecer
...!!!”. E aí no Brasil, sempre tomamos os portugas como parentes longínquos.
Este
distanciamento entre Brasil e Portugal, penso, é mais de tipo institucional do
que sentimental, embora as novas gerações portuguesas já se sintam europeizadas e um pouco
distantes do Brasil. Aliás, a presença ostensiva, aqui, de “retornados”, que são os portugueses que
até recentemente viviam em Angola , Moçambique, Guiné , Cabo Verde etc dá a África uma presença maior do que a da
América do Sul. Tempo, portanto, de recuperar espaços e entrelaçar experiências
culturais.
O
século XIX nos distanciou em virtude do processo de Independência, sempre
traumático. Havia ressentimentos dos dois lados. Tivemos, talvez, um interregno
de grande aproximação cultural e política entre os últimos lustros daquele
século e os primeiros do posterior. Anos de grandes luzes na literatura dos
dois países. Mas aí sobreveio a
hesitação de Portugal diante na II Guerra Mundial, seguido da longa ditadura
salazarista, com sua obstinada política colonizadora, ambas fatores de
reticências diplomáticas da parte do Brasil. De novo o distanciamento,
intercalado, apenas pela mão única do exílio de milhares de portugueses no
Brasil, uns ilustrados, como Conceição Tavares, decana octogenária dos
economistas brasileiros, outros, a grande maioria, oriunda do norte de
Portugal, com baixa escolaridade e premida pela fome e desemprego .
·
Joan Baez canta _Grândola, Vila Morena, música tema da
Revolução dos Cravos, em 1974_ (José Afonso).mp4 http://www.youtube.com/watch?v=o_bYb-Mces4&feature=related
A Revolução dos Cravos, em 1974, seguida do
processo de emancipação das antigas colônias, parte de seu ideário DDD (Democracia,
Descolonização, Desenvolvimento) francamente apoiadas pelo Itamaraty, parecia
dar um novo alento às nossas relações. Até porque, neste mesmo ano de 1974, se abria o regime militar , no Brasil, para um
processo de abertura que desembocaria na Constituinte de 1988. E isto, aliás,
ocorreu de fato. O final década de 70
foi marcado por inúmeras iniciativas de reaproximação ente os dois países. Fui
testemunha, como signatário da Carta de Lisboa, que marcou o retorno de Leonel
Brizola à vida política, em 1979, desta aproximação , graças à amplitude de
horizontes do líder socialista Mário Soares. Sentíamos, “Sob o céu de Lisboa”,
a proteção e apoio fraterno à abertura política no Brasil. Este terá sido,
talvez, um momento, entre 1975 e 1990, verdadeiramente pungente no entrelaçamento de nossas relações institucionais e culturais. Políticos, artistas e intelectuais
dos dois países freqüentavam-se com grande desenvoltura.
Mas
aí emergiram duas coisas que nos viriam
a distanciar de novo: (1) Participação de Portugal na nascente União Europeia; (2) Política Externa do
Governo FHC. Não vou me aprofundar sobre
tais fatos, apenas salientar que Portugal se volta crescentemente para a
União Europeia na tentativa de se alinhar aos parâmetros da modernidade
continental, fato consumado em 1992 e 1997 com a adaptação da Constituição de
Portugal aos Tratados da União Europeia assinados em Maastricht e em Amsterdã.
Ao mesmo tempo o Brasil, com Fernando Collor, mas sobretudo nos longos anos de FHC
começa a se rejubilar pela entrada no Bloco dos emergentes, mais preocupado com
o assento entre as grandes potências
mundiais do que com Portugal e o Terceiro Mundo.
Hoje,
porém, a Crise Econômica nos reaproxima. Ou melhor, pode nos reaproximar, desde
que nossos líderes sejam capazes de se
entreolhar pelas frestas dos interesses comuns, na busca de programas conjuntos
de cooperação para o desenvolvimento. A Europa é tanto um manancial de
inspirações civilizatórias, quanto um considerável mercado de 500 milhões de
consumidores. O Brasil, o líder de um vasto continente com uma considerável
constelação de recursos naturais e razoável estabilidade política. Só para se
ter uma idéia: Portugal, mercê da crise e desemprego, exporta, hoje, cerca de
70 mil jovens ao ano, supereducados, numa população estabilizada de 13 milhões
de habitantes. A continuar esta sangria o país terá perdido em vinte anos 10% do melhor de sua gente. Sempre
ao mar... sempre ao incerto, realimentando a nostalgia mítica desta povo. Isto não pode continuar. Tem que ser
revertido. E o Brasil pode contribuir de forma decisiva neste processo. Um só
programa de Turismo bem direcionado para Portugal, com apoio do Governo
Brasileiro, teria conseqüências inusitadas neste processo.
Outro ponto
crítico do Ano Brasil Portugal: Ausência total dos dois Estados mais próximos,
em termos históricos de Portugal: Rio Grande do Sul e Santa Catarina, as
duas últimas porções do Império Português na América do Sul.
O primeiro, tendo como capital , Porto Alegre, cujo primeiro nome foi Porto dos Casais, em homenagem aos de 60 casais açorianos lá chegados, em 1776, como garantia de controle territorial de
Portugal; o segundo, por semelhantes razões, fartamente estudadas - http://amigonerd.net/trabalho/45444-povoadores-de-fronteira
.
Por que firmar o
Protocolo do Ano Brasil Portugal em Belo Horizonte? Como não dar a um dos
Estados sulinos maior relevo simbólico e efetivo nesta programação?
Imperdoável. Embora se
compreenda: Trata-se do verdadeiro monopólio que Rio e S.Paulo exercem sobre os
mass media no país , com os conseqüentes
resultados no domínio da indústria cultural destes Estados sobre os demais. Até
parece que o pensar é uma exclusividade do centro do país, ao qual o resto se curva como mera audiência, nos comentários de televisão, nos grandes espetáculos, no
movimento editorial. Minas Gerais é a
exceção. Que se explica, em grande parte, pela proximidade com o eixo Rio/
S.Paulo, mas também por um fato reconhecido por vários analistas da
administração pública no Brasil: Tem a melhor estrutura administrativa de
Governo entre os Estados. Apenas um exemplo: Na década de 70 o Estado de Minas
já dispunha de claro diagnóstico de fatores restritivas de seu desenvolvimento
– O “Diagnóstico da Economia Mineira” - , o qual deu origem, dentre outros, à
criação de um órgão de promoção de investimentos, o INDI, responsável pela
primeiro deslocamento da industria automobilística no território nacional no
rumo de Betim. Nascia a FIAT do Brasil.
Mas enfim, mesmo
compreendendo as dificuldades para uma inserção mais dinâmica do Rio Grande do
Sul no ANO BRASIL PORTUGAL 2012-2013, nada nos impede de espernear. É o famoso jus esperneandi. Quem sabe, assim, “alguém...”
se toca...E aproveito para render
uma pequena homenagem a um grupo de estudiosos, que, em Gramado se dedicam
denodadamente ao estudo da colonização açoriana no Brasil: O Centro Luso Açoriano da Região das
Hortênsias , com preciosas informações nos sites www.arquivohugodaros.org.br
e www.gramadosite.com.br/cultura/mariliadaros
.
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